Irregularidade: metade da população de cidade no Piauí estava matriculada no EJA
Cerca de 68 milhões de brasileiros não concluíram a educação básica, um número preocupante. Contudo, o número de matrículas na Educação de Jovens e Adultos (EJA) em 2022 chamou a atenção da Controladoria Geral da União (CGU), que emitiu alerta em 35 cidades de 13 estados, apontando possíveis irregularidades e fraudes no sistema educacional.
O presidente do INEP, Manoel Palácio, explicou que a fiscalização dos dados é responsabilidade das comissões em cada município. O censo escolar, alimentado com informações enviadas pelas prefeituras e governos estaduais, é utilizado como base para a liberação de verbas federais, como o Fundeb, que financia a educação básica e a valorização dos profissionais da área.
Em 2022, as prefeituras receberam, em média, R$ 5 mil por aluno matriculado na EJA. As fraudes comprometem a política pública de educação, desviando recursos essenciais.
PAQUETÁ, NO PIAUÍ
A lista da EJA na cidade de Paquetá, está tão inflada que parece que quase metade da cidade está matriculada. Proporcionalmente, essa pequena cidade tem o maior número de matrículas na EJA do país. A reportagem do Fantástico investigou alguns nomes presentes na lista.
Um deles, Luiz Reis dos Santos, falecido em 2017, ainda aparecia como matriculado em 2022 e 2023. Outro nome, Valdeci Roque Cruz, que morreu em 2018, também estava na lista. A filha de Valdeci, professora na mesma escola, confirmou que ele foi retirado do censo logo após seu falecimento.
A prefeitura de Paquetá recebeu recursos do governo federal pela inscrição de Valdeci, como se ele estivesse vivo e frequentando as aulas, de acordo com a CGU.
Além disso, foi encontrado um aluno matriculado em Paquetá que, ao mesmo tempo, estava preso em Rondônia. Também foram identificados um sargento aposentado do Distrito Federal e sua esposa, ambos localizados em Goiás.
O QUE DISSERAM O ÚLTIMO E O ATUAL GESTOR
O prefeito atual, Clayton Barros, pertence ao mesmo grupo político do ex-prefeito e atual deputado estadual, Thales Coelho.
A reportagem do Fantástico tentou contato com Clayton Barros sobre a fraude na EJA. O assessor jurídico da prefeitura, Daniel Leonardo, afirmou que todos os alunos matriculados frequentam as aulas e, que a lista de presença foi encaminhada ao Ministério Público para investigação.
A prefeitura emitiu uma nota explicando que os nomes de pessoas falecidas foram retirados da lista em 2020, mas devido a um erro no sistema, continuaram lá. A nota também afirmou que o problema foi reportado ao INEP e os nomes foram removidos posteriormente.
O ex-prefeito Thales Coelho, agora deputado, declarou que não teve conhecimento de qualquer irregularidade na EJA durante sua gestão.
Girau do Ponciano em Alagoas
Girau do Ponciano, no agreste de Alagoas, tem 36 mil habitantes, e em 2022 mais de 12 mil estavam matriculados na EJA, o que corresponde a 35% da população, o terceiro maior número do país, atrás apenas de São Paulo e Rio de Janeiro.
O relatório da CGU aponta que mais de 3 mil alunos fantasmas estavam matriculados, incluindo pessoas falecidas e estudantes registrados em outros locais.
A cidade teria recebido indevidamente R$ 18,5 milhões. O prefeito Bebeto Barros, que era vice na gestão passada, não atendeu à reportagem do Fantástico, mas a prefeitura anunciou uma investigação interna.
São Bernardo, no Maranhão
A reportagem do Fantástico foi a São Bernardo, no Maranhão, com 27 mil habitantes, e obteve um áudio de uma agente de saúde espalhando informações falsas para captar alunos para a EJA. Tentativas de contato com a ex-secretária de Educação, Raquel Carvalho, e o ex-prefeito João Igor não tiveram resposta.
Em São Bernardo, uma família inteira estava matriculada na EJA de 2022, sem autorização para isso. O procurador Juraci Guimarães classificou a situação como um escândalo no sistema educacional, especialmente em um estado pobre como o Maranhão.
No Maranhão, dez cidades estão sendo investigadas por fraudes na EJA pela CGU, Ministério Público Federal e Tribunal de Contas do Estado. Após as investigações, as prefeituras afirmaram ter corrigido os dados inflados de matrículas. Em 2024, o número de alunos na EJA no estado caiu 30% em relação a 2023, com uma redução de mais de 67% em São Bernardo.
(Com informações do Fantástico)